Rain Blues

Daniel sente as primeiras gotas de chuva acertarem seu rosto enquanto caminha pelas ruas desertas da madrugada e ao constatar o temporal que estava prestes a cair deixa escapar um sorriso para si mesmo. “Só faltava mesmo chover.”, pensa ele, avaliando a sensatez da idéia de sair para dar uma volta as três da manhã de um dia de inverno. A chuva vai ficando cada vez mais forte, mas ele parece não ligar. Ele apenas tira sua gaita do bolso e continua a caminhar sem rumo enquanto toca um blues. Ao terminar a musica Daniel se vê em uma praça que lhe parece bastante familiar.

– Bela musica. – Ele ouve uma voz feminina falando – Mas você deveria tocar musicas mais alegres.

Daniel se vira e vê Andréa sentada em um velho balanço no meio da praça. Ela se balança lentamente, como se estivesse deixando o balanço se mover ao sabor do vento, e não parece se importar com a chuva. “Claro,”, pensa Daniel, “o lugar do nosso primeiro encontro.”.

– Não, não tem clima para isso. – Responde Daniel – Alem do mais blues tem que ser blue.

– Lá vem você com esses seus chavões… – Fala Andréa rindo – E o que você faz na rua embaixo dessa chuva numa hora dessas?

– Precisei sair de casa, andar um pouco para espairecer.

– As 3 da madrugada? Esqueceu de dormir, foi?

– Não. É que fica meio difícil de dormir quando eu penso em você.

Há um momento de silencio, cortado apenas pelo barulho da chuva. Daniel chega um pouco mais perto de onde Andréa está, enquanto ela fica olhando para o chão, evitando encarar ele.

– Não é engraçado como a gente sempre acaba parando aqui? – Fala Andréa anda olhando para o chão.

– Por que você fez aquilo? – Pergunta Daniel.

– Como naquela vez em que eu tava bêbada e acabei batendo o carro naquele poste… – Continua falando Andréa.

– Não muda de assunto! – Fala Daniel.

– Não foi culpa sua. – Responde ela dessa vez olhando nos olhos de Daniel.

– Nunca disse que achava isso. – Fala ele, agora desviando o olhar.

– Nem precisa. Ta estampado na sua testa. Eu te conheço, Daniel.

– Então sabia o quanto isso ia doer…

– Para com isso. Você sabe que eu nunca faria nada para te magoar…

– Então por que foi?

– Não teve nada a ver com você…

– Mas eu preciso saber…

– Não. Você só precisa esquecer. Precisa me deixar ir.

– E como eu faço isso?

Daniel então volta os olhos para onde estava Andréa e vê apenas o velho balanço se movendo ao sabor do vento.

– Eu preciso é começar a beber como as pessoas normais fazem… – Diz ele para si mesmo, antes de soltar um longo suspiro.

4 Responses to Rain Blues

  1. nelsonnetto says:

    gostei!
    ultimamente seus textos tem sido mais breves que o normal, mas ainda sim tem aquela coisa da estiga.
    e eu também acho que preciso beber como as pessoas normais.
    FH

  2. Lud says:

    gostei desse! 🙂
    faço coro ao nenéu. eu gosto da forma com que vc trata esses temas do ‘pq vc foi’. é uma espécie de paradoxo mto legal e sutil.

    :*

  3. v. says:

    eu, definitivamente, preciso beber como as pessoas normais. e é como a lud falou, acho que você manda bem nos textos de “pq vc foi”. gostei muito, man.
    FH

  4. Adoro! “Ouvi” o rangido do balanço sozinho no final…

Deixe um comentário